sexta-feira, 7 de agosto de 2009

o jantar




o jantar

todos os anos era aquele aborrecimento. tentava sempre arranjar maneira de se esquivar àquele cansativo, enfadonho encontro, mas o joão não aceitava. vinha logo com a conversa de não ser conveniente aparecer sozinho. que os outros sócios iriam pensar que havia algum problema entre eles. e que depois, no escritório, começariam os comentários irónicos.
tão cansativo era ter de ir ao tal jantar como ouvir a argumentação do joão, por isso, nem insistia e lá se arranjava para o compromisso. afinal seria apenas e tão só outra noite.
maçadora, mas outra noite.
desta vez desconhecia o local. pelo menos teria a oportunidade de se ir distraindo com a decoração. e com tanta coisa para fazer. perda de tempo!
cedências numa relação que se mantinha equilibrada, ainda assim. abriu a janela do carro, já em movimento, e olhou de soslaio para o joão. sorriu: amava aquele homem.
chegados ao restaurante, foram recebidos numa ante sala onde estavam quase todos. distribuiu sorrisos, alguns beijos, e pequenas frases feitas trocadas...
entretanto, foram chamados para a sala de jantar.
a decoração era excelente. as cores discretas, quentes. a iluminação fantástica. sentou-se e não pôde deixar de sorrir. afinal até se estava a sentir confortável. começaram a ser servidos e, ao som dum piano distante, ouviam-se pequenas gargalhadas, sussurros de conversas...
o joão tocou nas suas mãos, num gesto terno e cúmplice.
a dada altura, discretamente, conseguiu conquistar algum silêncio, alheando-se das conversas dos outros, e olhou para o tecto...
os seus olhos ficaram cativos do candelabro. semicerrou-os e deixou-se embalar pelo som cada vez mais longínquo do piano...descia, agora, uma escadaria enorme. ao fundo, do lado esquerdo, uma porta: o princípio de um salão vazio de pessoas, onde existia somente o candelabro e alguém que a esperava à entrada.
deixou-se conduzir até ao centro e, em sintonia com a melodia que viajava por aquele espaço, os corpos deslizaram pelo salão harmoniosamente.
e, quando a música...tocaram-lhe no ombro. era o joão que a chamava. alguém queria saber qualquer coisa. respondeu e fechou, de novo, os olhos. mas o momento anterior terminara.
perdera-o.

(foto: candelabro, wind)

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