domingo, 9 de agosto de 2009

depois dela partir

entrou. a casa era sua. os tectos, as paredes, as janelas. tudo. era ali que queria estar. sozinho. outra vez sozinho.
a morte fora um imprevisto e agora era de novo o princípio. sem ela.
por isso as paredes estavam nuas. as janelas fechadas, as portas entreabertas...apenas o espaço para ele passar.
não se queria lembrar de nada. queria o vazio. queria a solidão. queria que todos os barcos passassem por ele sem o ver.
queria que amanhã o dia fosse o de ontem.
queria que as rosas do jardim voltassem a ser colhidas.
queria que as cores dos livros que outrora estavam nas estantes voltassem a sentir o calor do sol matinal.
queria...
queria que ela estivesse ali.
de repente parou.
ainda lá estava a cadeira. a cadeira onde ela se sentava todos os dias depois de descer as escadas.
esquecera-se da cadeira.
e agora?!
ficou petrificado, agarrado às tábuas do chão como alguém que quer pedir socorro e não consegue.
parou porque também já não tinha forças para fazer mais nada.
parou porque não se quisera lembrar de pedir que lhe levassem, também, a cadeira.
parou.
chorou.
e teve saudades.
do seu sorriso; da sua voz; do movimento do corpo quando se levantava de manhã.
do perfume; das cores das roupas; das gargalhadas cristalinas..
chorou.
lembrar-se.
a cadeira estava lá.
e teve vontade de subir as escadas, correr para o quarto, deitar-se nos lençóis que ainda teriam o seu cheiro...
mas não podia.
os degraus já não estavam lá.
também os degraus tinham partido.
ele quisera assim.
quisera esquecer.
agora era apenas uma espiral. e lá em cima estava o seu sonho.
ela morreu.
e ele queria apenas descansar.

saiu de casa.

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